O Deus Algoritmo
O Algoritmo. Essa entidade mágica e onipotente, que organiza e cataloga como nós interagimos na internet, como organizamos a nossa vida, com quem falamos, quem podemos ver e qual assunto devemos prestar mais atenção agora.
A introdução do “algoritmo” nas plataformas digitais sempre entra com a justificativa de que é uma forma mais inteligente e mais otimizada de apresentar o conteúdo da plataforma. Quem lembra quando o Instagram passou a reordenar o seu feed usando O Algoritmo? 1 Lembram-se tambem que foi justamente quando foi adotado uma política mais violenta de anúncios e conteúdo pago.2 Sabe aquela foto legal que seu tio postou? Foi engolida pelo algoritmo em troca de uma postagem do perfil que está “mais engajado”, ou seja aquele perfil que tem uma boa quantidade de seguidores, postagens com mais comentários e fotos com mais curtidas. Conhece aquele perfil que produz conteúdo como uma fonte de petróleo recém descoberta? Pois é, para melhor se posicionar para o algoritmo, ele força produtores de conteúdo a ter que estar em um estado de constante conexão com a plataforma, muitas vezes se esgotando e entrando em um estado de burnout 3. E como a lógica vigente é sempre de nunca resolver o mal pela raiz e sim remendar o problema, o Facebook, por exemplo oferece a solução de que você possa marcar 10 perfis para “Ver Primeiro”, assim num primeiro momento sua linha do tempo parece organizada antes que você interaja com o conteúdo cuidadosamente escolhido pelo algoritmo, a nossa entidade mística que conhece você melhor que você mesmo, através da palavrinha mágica da vez que é o Big Data 4.
No outro espectro, temos uma massa de pessoas zumbificadas, engajadas nas plataformas, não de forma orgânica, mas de forma procedural. Os engenheiros dessas plataformas se gabam e criam eventos gigantescos 5 para discutir formas mais otimizadas de como manter o usuário em um estado de constante engajamento, técnicas novas para “ajudar as pessoas a se conectarem”, uma palavra bonita que significa “como arrancar cada segundo do tempo dessa pessoa na nossa plataforma”. O Instagram, por exemplo introduziu uma funcionalidade que faz isso de forma bem simples e sutil. Ao abrir um link, ao invés de redirecionar você para o navegador do seu celular que você escolheu, ele abre uma interface e mostra aquele conteúdo dentro do próprio instagram, em um navegador dentro do próprio aplicativo. Usuário bom, é usuário conectado, sempre!
Em outra ponta, oferecem ferramentas para que influencers possam “etiquetar” algum item e levar a compra, tudo é claro, dentro da plataforma. Enfim, a ideia é que você nunca desligue, nunca pare de ver atualizações, e que essa plataforma seja o teu portifólio e espelho de quem você é ou que gostaria de ser, moldando todos os teus interesses e como você se informa venha através dela, através do seu grandioso e controlado véu.
Além disso, essa verdadeira praga que é o deus algoritmo, se alastra e modifica a forma como trabalhamos. Ou seja, não bastando moldar a forma como interagimos como as pessoas e nossos circulos sociais, ele ainda serve para direcionar a classe trabalhadora mais precarizada. Plataformas como Rappi, Uber Eats, iFood, e suas cópias com nomes fofos, trabalham e são regidas por esse ser que “melhor conecta os entregadores com os restaurantes”. Ele também contabiliza quantas entregas já foram feitas por aquele entregador, quais as distâncias percorridas, e se o entregador atual está “merecendo” a próxima entrega. É bem sabido, por exemplo que entregadores que não entregam o pedido no prazo correto, são penalizados, perdendo pontos no Rappi 6. Pontos esses que determinam o número e quantidade de pedidos que aquele entregador vai receber no dia. Enquanto isso, eles tem de ficar com o aplicativo ligado, pronto e à postos para de no caso, se Deus quiser receberem um pedido, seja no frio, na chuva, no calor intenso, não importa. 7 O “algoritmo” por qual se escondem essas empresas é frio e não tem pena de trabalhador.
Em contrapeso ao mundo dos ‘Big Five’ 8, onde basicamente cinco conglomerados controlam a maior parte da internet, plataformas alternativas como Mastodon, Pleroma e Diaspora, se colocam contra a lógica de algoritmos. Você vê tudo em ordem cronológica. Não existe recomendação de perfis que você pode querer seguir, afinal para fazer isso, a plataforma teria que ler e analisar o conteúdo das informações que você posta. E acima de tudo, são auditáveis, pois são construídas de forma coletiva e aberta. Qualquer pessoa pode ler o código delas. Isso nos serve de lembrete constante de que essas plataformas não servem o nosso interesse e de que não existe “código apolítico”. Para essas plataformas nós somos o produto, a mercadoria. Você enquanto programador é um ser pensante e um ator político, e o código que você escreve, ajuda e serve o interesses de alguém. A questão é, serve os interesses de quem?
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https://www.buzzfeednews.com/article/alexkantrowitz/robots-run-this ↩︎
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Expressão que significa a ciência de mineração de dados, ou seja a plataforma em questão analisa e armazena quaisquer dado possível sobre você, montando uma rede de informações que é processada e vendida para anúnciantes. ↩︎
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F8 é o evento anual do Facebook onde eles apresentam as novas atualizações da empresa, números e promessas. ↩︎
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https://blogbra.soyrappi.com/quais-as-vantagens-dos-pontosrappi ↩︎
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https://revolushow.com/80-breque-dos-entregadores-de-aplicativo/ ↩︎
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“Big Five” é um apelido para o maior oligopólio tecnologico existente, onde basicamente 5 empresas (Facebook, Google, Apple, Amazon, Microsoft) controlam a maior parte da internet, aliás, segundo a Forbes somente o Google era responsável por 40% de todo o tráfego de internet em, pasmem, 2013. ↩︎